quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

O PAPEL ACEITA MESMO TUDO?

Diz o ditado que “o papel aceita tudo”. Qualquer proposição pode ser escrita em uma folha de papel - para fins do argumento, considere que pode-se contar com uma folha tão grande quanto for necessário, os caracteres podem ser encolhidos indefinidamente ou mesmo pode-se utilizar uma linguagem mais econômica, a qual requeira menos caracteres para expressar uma proposição.

Dado isto, segue-se que qualquer proposição verdadeira pode ser escrita numa folha de papel (quer reconhecemos a verdade ou não).

Digamos que eu pegue uma folha de papel e comece a escrever quaisquer verdades que me venham a cabeça: “2+2=4, “existe um único próton no núcleo de um átomo de hidrogênio”, “Charles Dickens é autor de A Tale of Two Cities”...

Em um momento eu paro para pensar no que mais poderia escrever, e vejo que ainda não está escrito na folha que 2+3=5. Então eu percebo que “2+3=5, mas ainda não está escrito na folha que 2+3=5” também é uma proposição verdadeira que poderia ser escrita na folha. Contudo, antes mesmo de terminar de escrevê-la, ela já seria falsa.

Desta forma, há verdades logicamente impossíveis serem escritas em uma folha de papel.

Se “proposição verdadeira” fosse a mesma coisa que “verdade”, seguiria que há proposições logicamente impossíveis de serem escritas, ainda que em condições ideais estabelecidas. Oras, esta conclusão é inaceitável. Assim, “verdade” e “proposição verdadeira” são coisas distintas. Ou seja, uma proposição não porta a verdade, mas aponta para esta.



Autor: Dante Cardoso Pinto de Almeida



segunda-feira, 7 de março de 2011

A Parábola do Médico de Campanha e o Trilema de Münchhausen

Minha parábola zen budista preferida é a do médico de campanha, a qual gostaria de partilhar convosco.


Havia um médico de campanha que acompanhava um pelotão. Parecia-lhe que sempre que ele salvava a vida de um soldado, este perecia tão logo voltasse ao combate.

Isto lhe causou uma profunda crise existencial. Afinal, de que valia todo seu trabalho e esforço em salvar vidas se estas duravam tão pouco?

Assim, o médico de campanha exilou-se para estudar com um mestre zen budista. Após meses de estudo ele teve uma iluminação e retomou seu trabalho. Desde então, caso alguém lhe perguntasse o porque dele fazer o que faz apesar de tudo, ele simplesmente respondia: Porque sou um médico de campanha.

Identifico-me bastante com esta parábola. Nunca tive uma crise existencial muito profunda acerca da minha vocação, mas fico desconcertado quando me perguntam porque eu cursei filosofia. Eu simplesmente sou um filósofo, oras.

Façamos justiça aos meus inqueridores. Pessoas tem as mais diversas razões para seguir uma carreira. Há aqueles que dizem amar o que sua carreira representa, como médicos que almejam salvar vidas, advogados que desejam fazer justiça, cientistas que visam contribuir para nosso entendimento do mundo e talvez descobrir soluções para nossos maiores problemas etc. Há também aqueles que dizem seguir uma carreira por suas perspectivas financeiras ou porque foram obrigados pelos pais.

Dado isto, permitam-me lhes falar sobre o trilema de Münchhausen. Se todas nossas alegações devem ser justificadas, o que se faz por meio de outras alegações, então cairemos em uma das seguintes situações:

  1. Caímos numa regressão infinita de alegações, cada uma justificada pela seguinte.

  2. Acabamos nos repetindo, caindo em um raciocínio circular.

  3. Chegamos a alguma alegação que é aceita dogmaticamente ou axiomaticamente, isto é, sem justificação.

Dado isto, vejamos em que qual das situações eu cairia se fosse justificar a alegação de que eu sou um filósofo. Para efeito deste exercício, considerarei que caí na situação #1 caso eu fique cansado de dar justificações, na situação #2 no caso de me repetir e na situação #3 no caso de eu não for capaz de dar mais justificações.

Pois bem, por que eu sou um filósofo? Vejamos... eu amo filosofia. Tenho um enorme prazer em discutir o assunto, assim como ler e escrever sobre ele.

Oras, mas ter prazer em discutir, ler e escrever filosofia é justamente a definição de um filósofo. O que eu fiz é equivalente a dizer que sou filósofo porque sou filósofo.

Evidentemente caí na situação #2 logo na primeira justificativa. No futuro, caso seja-me solicitado justificar a afirmação de que eu seja um filósofo, poupar-me-ei do trabalho e cairei logo na situação #3, sem dar uma justificação sequer.


Autor: Dante Cardoso Pinto de Almeida



sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Pirro e Zhuangzi

Pirro foi um filósofo grego que professava o cepticismo radical, isto é, ele acreditava ser impossível obter conhecimento sobre o que quer que seja. Dizia ele que se uma tese pudesse ser racionalmente defendida, a tese oposta também o seria. Assim, nunca poderíamos optar racionalmente por uma crença em detrimento de outras.

Conta-se uma anedota que ilustra o posicionamento de Pirro, na qual este, ao se deparar com seu mestre com a cabeça presa em um buraco de árvore, pondera por um momento, conclui que não há como saber se ajudá-lo seria algo bom e o deixa lá. Outros discípulos, após ajudar o mestre, censuram Pirro por sua inação. Contudo o próprio mestre toma partido de Pirro, enaltecendo sua coerência.

Tal extravagância intelectual não é exclusividade de pensadores ocidentais. Zhuangzi, considerado o maior expoente do taoismo depois de Laozi, uma vez sonhou que era uma borboleta e durante o sonho esqueceu completamente que era Zhuangzi. Ao acordar não sabia se Zhuangzi que sonhou que era uma borboleta ou se a borboleta estava a sonhar que era Zhuangzi.

Contudo, arrisco dizer que Zhuangzi nunca (in)agiria da mesma forma que Pirro na anedota acima. Oras, se o conhecimento é impossível, como dizia Pirro, então por que ponderar antes de agir (ou não agir)? Segundo seu próprio cepticismo, ele não teria como saber se ajudar o mestre seria algo de bom, mas também não teria como saber se não ajudar seria.

O taoismo de Zhuangzi foca-se na espontaneidade. Não haja conscientemente e viverás em paz com o Tao.

Já Pirro, segundo a anedota, parecia querer que suas ações fossem justificadas (ainda que acreditasse na impossibilidade disto) e, em caso de dúvida, agia segundo o princípio do mínimo esforço.

Claro que não precisamos ser tão cépticos quanto Pirro para duvidar que a anedota tenha de fato ocorrido. Talvez ela tenha sido apenas criada com o intuito de ilustrar sua filosofia. Mas eu fui espontâneo e não ponderei muito antes de iniciar minhas ponderações sobre o tema.


Autor: Dante Cardoso Pinto de Almeida



quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

O Navio de Teseu e Eu

Teseu foi o mítico matador do Minotauro e fundador de Atenas. Segundo o biógrafo grego Plutarco, o navio que levara Teseu até Creta, lar do monstro, fora preservado no porto de Atenas como um memorial. De tempos em tempos se fazia necessário reformar o navio, inclusive substituindo partes apodrecidas por partes novas, o que suscitava entre os filósofos a indagação: o navio aportado seria o navio de Teseu ainda que todas suas partes originais tivessem sido substituídas por novas? Seria o mesmo, ainda que a maior parte do navio tivesse sido substituída? Mesmo se uma única tábua o fosse?

Isto exemplifica o problema filosófico da identidade dos mutáveis, o qual resumo nos seguintes termos: Se as entidades são caracterizadas, identificadas e definidas por meio de sua composição e seus atributos, como é possível caracterizar, identificar e definir aquilo cuja composição e atributos são alterados ao passar do tempo?

Eu, como todos os seres vivos, sou um caso particular deste problema. Mais da metade da minha massa corporal é água, a qual perco e reponho todo dia. Eu corto unhas e o cabelo. Perco e ganho peso. Células de várias partes do meu corpo morrem e dão lugar a novas. É possível que hoje não haja um só átomo no meu corpo que havia no dia do meu nascimento.

O problema não é menos complicado sob o aspecto psicológico. Ao longo da minha vida adquiri e perdi memórias, hábitos, traços de personalidade etc.

Dentre as diversas soluções propostas a este problema, gostaria de mencionar duas. A primeira chamo de antimaterialista, a qual é resumível no argumento: Restringindo-se apenas a conceitos materialistas é impossível me identificar, definir ou me caracterizar. Oras, eu sou identificável, definível e caracterizável. Portanto deve haver algo além do denotado pelos conceitos materialistas, ou seja, a realidade não se resume à matéria.

A segunda abordagem, a qual não chamo por algum nome específico, não apenas rejeita a segunda premissa do argumento antimaterialista, como chega a uma conclusão contraditória a esta. Eis seu argumento: É impossível me identificar, definir ou me caracterizar, quer seja por meio de conceitos materialistas, quer seja por conceitos psicológicos (ou ambos). Portanto sou inidentificável, indefinível e incaracterizável.

Eu diria que pertenço ao conjunto dos indivíduos que aceitam esta solução, não fosse pela dificuldade inerente em identificar como elemento de um certo conjunto algo que é inidentificável, indefinível e incaracterizável.


Autor: Dante Cardoso Pinto de Almeida

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Paradoxo do Bebedor

Na Lógica Clássica, há alguns teoremas envolvendo a implicação considerados paradoxais. Os mais famosos são:



Estes paradoxos não consistem em antinomias, como o “Paradoxo de Russell” ou o “Paradoxo do Mentiroso”. O caso é que eles não expressam nosso entendimento intuitivo de “implicação”.
O assunto fica ainda mais interessante quando lidamos com quantificadores. Em seu livro What is the name of this book?”, o lógico Raymond Smullyan popularizou um teorema que ele chamou de O Paradoxo do Bebedor:


Se lermos D como “beber”, o Paradoxo do Bebedor é legível como “existe alguém que, se ele/ela bebe, então todos bebem”.

Em vista de simplificar a demonstração deste teorema, farei uso do tertiun non datur (i), prefixação (ii), Lei de Duns Scotus (iii), e intercâmbio de quantificadores (iv).

(i)

(ii)

(iii)

(iv)

Em palavras a prova pode ser expressa como:
Todo bebem ou nem todos bebem(1).
Suponha que todos bebem(2). Logo, se um indivíduo arbitrário bebe, então todos bebem(3).
Suponha que nem todos bebem(6) e toma um indivíduo arbitrário que não bebe(8). Logo, se ele bebe, então todos bebem(9).
Q.e.d.

Isto soa estranho, mas lembra-te:


.
Então de
,
obtemos
.
Intercambiando os quantificadores obtemos

isto é, não é o caso de todos beberem e alguém não beber.




Autor: Dante Cardoso Pinto de Almeida

Creative Commons License





segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Construções geométricas com régua e compasso (legendas em Português)

Há muito tempo atrás criei algumas animações descrevendo algumas construções geométricas com ferramentas euclidianas.
Os vídeos estão em domínio público. Portanto, fiquem à vontade para utilizá-los como quiserem.

Construção do pentágono regular




Método alternativo de construção do pentágono regular




Construção do hexágono regular




Duplicação do quadrado, tal como descrito por Platão em Ménon




Divisão de um segmento em extrema e média razão (proporção áurea)




Trisecção de um segmento




Dada uma unidade de comprimento, encontrar segmentos de reta cujo comprimento corresponde à raiz quadrada de números naturais





Orquestra Barroca de Freiburg toca Concerto de Bradenburgo nº3 de J.S. Bach

Os Concertos de Bradenburgo foram apresentados pela primeira vez em 1721, ano da morte de seu compositor, Johann Sebastian Bach. Eles ficaram arquivados em Bradenburgo até serem redescobertos na metade do século XIX.




Ouça a concertos da Orquestra Barroca de Freiburg:

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Entrevista com Milton Friedman (áudio em Inglês e legendas em Português)

Milton Friedman foi um economista americano ganhador do Prêmio Nobel.









Leia livros de Milton Friedman:


Monólogos de Alan Watts animados por Trey Parker e Matt Stone (áudio em Inglês)

Alan Watts foi um filósofo profundamente influenciado pelo pensamento oriental, principalmente taoismo e zen-budismo.

Trey Parker e Matt Stone são os criadores do desenho South Park.







Leia livros do Alan Watts:



Assista às obras de Trey Parker e Matt Stone:



Entrevista com Prof. Newton da Costa (áudio em Português)


O professor Newton da Costa é um lógico brasileiro e uma das maiores autoridades no mundo (talvez a maior) em lógicas paraconsistentes.







Leia livros de Newton da Costa:


Graham Priest fala sobre o que é filosofia (áudio em Inglês)



Leia livros do Graham Priest: